quarta-feira, 5 de setembro de 2007

Zoada



Devia esconder todas as frases mais absurdas para serem lidas no dia em que morrer. Entenderiam a razão de todas as falhas despropositadas que me pregavam rasteiras que me vestiam de sangue os joelhos. Por vezes, as minhas mãos suicidam-se em verso. Impedem-me de me mover, de actuar como as defeituosas cordas vocais de um mudo. Devia deixar-me desmaiar de tanto riso e adormecer com o cansaço sincero de quem é realmente feliz. Estou francamente doente e escavo nas palavras dos poetas na esperança de conseguir reaver a voraz dedicação das mãos. Das minhas mãos. Se, por um instante, pudesse antever o que me espera e se sentisse que todas as palavras me abandonaram, lançava gasolina a todas as noites e esperava que o seu fogo me consumisse entre as febris alucinações.



Maria Rocha, 2007

6 comentários:

Marta disse...

Uau...

As frases mais absurdas de cada um, são as que nos distinguem dos demais. São absurdas, mas são o que nós somos e não devem ser guardadas para quando já não interessa se nos compreendem ou não porque já não estamos cá.

Conheço muito pouco de ti, mas o pouco que conheço, obrigada por conhecer, e obrigada pelo teu comentário.

Beijo

T.E. disse...

O absurdo será uma "febril alucinação"? E a alucinação, talvez uma "morte em verso"? E o verso, uma voraz dedicação das mãos? E as mãos, poderão "desmaiar de tanto riso"? E o riso, será um instante entre todas as "falhas despropositadas"? E as falhas serão rasteiras de um "cansaço sincero"? E o cansaço de morrer será absurdo?

Vanessa Lourenço disse...

Peculariedades, nem todos as têm.
Porque é preciso ter-se as mesmas, ser-se peculiar é algo, depreendo, bom. Gosto de pensar que entendo de peculariedades, já que conheço muitas que até andam. Gosto de dizer, também, que me apraz conhecer as peculariedades da jovem em questão.
Um beijo.*
Talvez o "opium" seja a solução...

Maria disse...

marta: Nada a agradecer. É com prazer que leio as tuas coisas. : )
E quanto a isso das frases absurdas não deverem ser guardadas... Concordo contigo em parte. Por vezes, são frases (que podem resultar em acções) fatais e pouco sãs. Se nos compreendem ou não (agora ou depois) é uma daquelas incógnitas cruciais. Se visitássemos a cabeça das pessoas de vez em quando, talvez conseguíssemos saber isso.

Outro. *

bordello: Todas as tuas perguntas se vestem de retórica pura e dura. São, como já disse antes em tempos, uma espécie de cão (no caso, cães) atrás da cauda. A pergunta transforma-se em resposta. E, no entanto, faz tudo um sentido certeiro. Mais do que possas imaginar.


vanessa lourenço:
Deste lado, garanto que são muitas. E desse, pelo que apreciei, também são bastantes. É bom sinal. Muito bom sinal, aliás.

Isso do 'opium'... como já repeti ao nosso João... tenho aquilo que se pode considerar uma pedra de **** no cérebro. Depois explico-te. Ou ele, ahaha.

Acho que deu para perceber naquela noite da peça, não? Riso atrás de riso. : )

E se é a solução... acho que tenho cura vitalícia.

Outro.*

sílvia dias disse...

Liberta tudo o que carregares dentro. Por muito absurdo que seja. Ninguém nunca quer saber realmente, ou então temos sempre esta noção de solidão nas costas que mantém afastado quem se tenta aproximar.

João Morgado disse...

O suícidio delas é a prosa inacabada do vento. O teu absurdo cai tão bem em mim, faz sentido como uma estrada não faz.

A gasolina é apenas combustível para a vontade de incendiar esta noite, este momento, este ser. O fogo é luz, não é morte. E enquanto assim o for, podemos viver o que quisermos.

Pedra de hash!! A vanessa tem um compartimento de coca!*