quarta-feira, 12 de setembro de 2007

Hiatus.


Para que não estranhem (caso isso fosse acontecer, de facto) o meu 'desaparecimento',
deixo-vos aqui uma nota de que me vou ausentar do Trilho por tempo indeterminado.
Fica também registado o meu sincero Obrigada a todos os que por aqui passam, lêem e
deixam por cá as suas apreciações críticas (ou não).

Até,


Maria Rocha

Interlúnio - as verdades imemoriais (parte II)


De tempos a tempos, surgiram pessoas estranhas que ocuparam a casa dos verbos e que fintaram todos. Todos os versos e todos os excertos de prosa ficarão guardados para sempre em cada gesto de mãos e de olhos por finalizar, com a dose exacta de elegância e de engenho. Costumam dizer que quem escreve se enfrenta com todos os seus fantasmas a qualquer hora.

E que a soma de todas essas horas, em que se espalha contra uma parede banca um punhado de verdades mascaradas de normalidade, irá colidir num momento perfeito.

Tira esse sorriso do rosto.

O segredo da poesia não foi perturbado.
Apenas desapareceu no inacabado poço adolescente do esquecimento.

A música alta costuma acompanhar sempre que se precise de infligir uma dor de cabeça que abre o caminho para uma cama desconfortavelmente necessária.
Tudo faz parte deste estranho, inconformado, acelerado e doente passo.

Os homens nunca se deixarão desvendar.
Será sempre um universo desajustado.
Guardam-se relógios nos bolsos, maridos e esposas em casas, filhos em escolas e os corações em caixas.

Nada disto faria sentido se não estivéssemos a descamar todas as sossegadas mentiras de cave.

A beleza de todas as palavras postas a secar depois de uma valente e odiosa enxurrada surge e desaparece sem aviso prévio. Mais tarde, insurge-se contra si mesma e metamorfoseia-se.

Duvida de tudo. De todos. Põe tudo em causa.
Principalmente, a tua mente.

A secretária cede lugar a qualquer mesa de café rasca escondida junto ao balcão.
As folhas de papel folgam e ofecerem a tarefa a guardanapos, a maços de tabaco vazios, a costas e palmas de mãos.

A cidade anseia por pegadas marcantes na lama que o Inverno trará.
Haverá provas de que o trilho sempre se fez e haverá quem o siga em nómada curiosidade.

Todos os versos se enterraram - é esta a perfeita e derradeira colisão.

"Mesmo que viremos costas ao fim do trilho iremos dar-nos conta de que estamos espelhados inversamente e que jamais poderemos fugir ao destino de chegar ao fim da viagem."




Maria Rocha, 2007

sexta-feira, 7 de setembro de 2007

Interlúnio - as verdades partidas (parte I)



Os homens devoram-se a si mesmos, esporadicamente. É apenas um ritual de metamorfose. Uma espécie de amor desmedido que acaba em sobrevivência animal e que vai deixando um odor intenso, um rasto de textos e de fotografias em cada centímetro do chão desta cidade.

Neste momento, asseguro-te que todas as nuvens de lava que se despenharam contra as paredes externas do teu corpo foram apenas uma imagem física com que te injectaste.

Senta-te. Põe-te confortável.

Todas as galáxias em parto acabaram por se dissipar no epicentro de uma forte dor de cabeça. Todos os astros adormecidos aniquilaram-se no seu sono.

Sabia que a noite estava próxima - uma vez mais -, pois haviam copos de água militarmente arrumados a cercar a secretária desarrumada.

Há vestígios de dor ao longo desta página.

Tentaram estrangular as putas que lhes roubavam as esquinas meticulosamente iluminadas em que se guardavam as mais velhas palavras carregadas de choro, de suor e de angústia.

Tanto faz que a música de fundo esteja em repetição e que se possa vir a lapidar a vontade singular de morte híbrida de qualquer coisa.

Todos os poemas se ajoelharam à porta de suas casas.



Maria Rocha, 2007

quarta-feira, 5 de setembro de 2007

Zoada



Devia esconder todas as frases mais absurdas para serem lidas no dia em que morrer. Entenderiam a razão de todas as falhas despropositadas que me pregavam rasteiras que me vestiam de sangue os joelhos. Por vezes, as minhas mãos suicidam-se em verso. Impedem-me de me mover, de actuar como as defeituosas cordas vocais de um mudo. Devia deixar-me desmaiar de tanto riso e adormecer com o cansaço sincero de quem é realmente feliz. Estou francamente doente e escavo nas palavras dos poetas na esperança de conseguir reaver a voraz dedicação das mãos. Das minhas mãos. Se, por um instante, pudesse antever o que me espera e se sentisse que todas as palavras me abandonaram, lançava gasolina a todas as noites e esperava que o seu fogo me consumisse entre as febris alucinações.



Maria Rocha, 2007